PREPARAÇÃO PARA O RETIRO
SEMANA DO SILÊNCIO
Ó Intensa Luz do meu Deus, vem em meu auxílio, ensina-me a falar, ajuda-me a calar!...
Maria, porém, guardava todas estas coisas, meditando-as em seu coração. (Lc 2,19)
1. O SILÊNCIO INTERIOR
Dois elementos fundamentais constituem a essência de toda santidade: o desapego de si mesmo e a união com Deus. Estes elementos encontram-se, com matizes diferentes, na vida de todos os santos. Cada estrela difere uma da outra, não só pela grandeza, mas pela luz própria, pelo brilho particular. Deus é multiforme em seus santos. Seria inútil pretender dar um molde idêntico a dois santos da mesma família, grupo, movimento ou alma carismática: sob caracteres comuns escondem-se diferenças irredutíveis.
O papel do teólogo, que se interessa em perscrutar as profundezas de uma alma, consiste em saber discernir estas diferenças. Distinguir é ver melhor. Podemos ter como exemplo duas almas da Igreja privilegiadas por Deus para confrontarmos este pensamento: Santa Teresa do Menino Jesus e Elisabete da Trindade. Seus caminhos são essencialmente diversos. A Carmelita de Lisieux cobre todo o orbe católico com as pétalas de rosas desfolhadas por amor. Ela ensinou ao mundo moderno o tornar-se criança junto a Deus. A Carmelita de Dijon cumpre sua missão junto às almas interiores. Foi a santa do silêncio e do recolhimento.
O profeta Elias, o primeiro eremita, a quem Deus havia ordenado fugir dos lugares habitados, e esconder-se no deserto, longe da multidão: Vai-te daqui, retira-te para o Oriente e esconde-te na torrente de Carit (1Rs 17,3), foi quem ensinou aos monges eremitas da santa montanha do Carmelo, a se libertarem de tudo que não é Deus, para conservarem somente na presença de Deus vivo, com exclusão de toda outra presença.
Silêncio e solidão - aqui está o mais puro espírito de intimidade com Deus. Na acepção de Elisabete da Trindade existem três espécies de silêncio: exterior, interior e, enfim, um silêncio todo divino, em que a alma fica puramente passiva, e que é um dos efeitos mais elevados dos dons do Espírito Santo; por falta de termo próprio e inspirando-nos em um de seus textos, poderíamos chamá-lo: o silêncio sagrado, o silêncio de Deus.
Quando o Cordeiro abriu o sétimo selo, fez-se no céu um silêncio de meia hora... (Ap 8, 1)
O verdadeiro silêncio é o da alma, onde ela encontra Deus.
Saber imolar a tudo com ardor implacável: o olhar, o pensamento e o coração é colocar todas as nossas faculdades a serviço daquele que é o céu de nossa alma: é preciso separar-se de tudo para possuir Aquele que é tudo.
Consagrai e oferecei as vossas três potências: Inteligência, coração e alma à Santíssima Trindade. (Jesus a Franca)
Este silêncio interior é o Evangelho puro: quem quer elevar-se a Deus pela oração, deve impor silêncio em si, às vãs agitações de fora e aos ruídos de dentro, retirar-se ao mais profundo de si mesmo, e aí no segredo, recolher-se de “portas fechadas”, diante da face do Pai.
Tu, porém, quando orares, entra no teu quarto, fecha a porta e ora ao teu Pai que está escondido. E o teu Pai, que vê no escondido, te dará a recompensa. (Mt 6,6)
Assim orava Jesus Cristo naquelas noites silenciosas da Palestina, em que ia só, à tarde, para a montanha, a fim de passar a noite “em oração a Deus”.
Naqueles dias, Jesus foi à montanha para orar. Passou a noite toda em oração a Deus. (Lc 6, 12)
TU, QUE ÉS TÃO EFICAZ, ESCUTA A MINHA PRECE, SAI DE UM CORAÇÃO QUE CALA! SENHOR, NESTE SILÊNCIO DURADOURO ESCUTA A MINHA VOZ E...REVELA-ME O FUTURO.
2. ETAPAS PARA O SILÊNCIO EM DEUS
Segundo sua graça própria, Elisabete da Trindade compreendeu num sentido verdadeiramente evangélico a verdade sobre o silêncio de todas as potências da alma, guardadas só para Deus. Nenhum ruído dos sentidos exteriores, na imaginação, na sensibilidade, na memória, na inteligência, na vontade. Nada ver. Nada ouvir. Em nada se deleitar. Não se fixar em nada que possa distrair o coração ou retardar a alma em sua marcha para Deus. Seguem-se algumas etapas que devemos exercitar que são pontos fundamentais para quem deseja chegar numa íntima união com Deus:
a) SILÊNCIO NO OLHAR
Deve-se vigiar, antes de tudo, o olhar. Já dizia Jesus no Evangelho:
“A lâmpada do corpo é o olho. Portanto, se o teu olho estiver são, todo o teu corpo ficará iluminado”(Mt 6,22)
A impureza, assim como uma multidão de imperfeições, vem desta falta de vigilância sobre os olhares. Davi, depois de dolorosa experiência, suplicava a Deus “evitasse que seus olhos vissem o que era inútil” (Sl 119 [118], 37), porque aí havia sua alma se manchado. A alma virgem (pura) não consente num só olhar fora de Cristo.
b) O SILÊNCIO DA IMAGINAÇÃO
Não menos necessário é o silêncio da imaginação e das outras potências da alma. Quantas sensações interiores e impressões trazemos sempre conosco e nos ameaçam de prender-nos de novo em suas malhas. Também aí se deve exercer a ascese do silêncio. Uma alma que se diverte ainda com reminiscências, “que persegue um desejo qualquer” alheio a Deus, não é uma alma de silêncio, tal qual Deus deseja. Há nela “dissonâncias”, sensibilidades ruidosas, que impedem o concerto harmonioso que as potências da alma não deveriam cessar de elevar a Deus.
Põe, Senhor, uma guarda à minha boca, vigia a porta dos meus lábios. Não deixes que o meu coração se incline ao mal e pratique a maldade com os pecadores. (Sl 140, 3)
A inteligência, por sua vez, deve fazer calar todo ruído humano. “O menor pensamento inútil” seria nota falsa que fora obrigatória banir a todo custo. Um intelectualismo requintado que deixa a nossa inteligência andar sem rumo certo por coisas a que estamos apegados exageradamente é um obstáculo sutil ao verdadeiro silêncio da alma, onde se encontra Deus na fé pura.
Jesus, no entanto, permanecia calado. ( Mt 26, 63)
São João da Cruz nos ensina: “Devo apagar todas as outras luzes”, atingir Deus, não por um edifício sabiamente construído com belos pensamentos, mas pela nudez do espírito.
c) SILÊNCIO NA VONTADE
É nela que se opera nossa santidade: é a faculdade do amor. Atribuímos a ela, com razão, as últimas purificações preparatórias à união transformante com Deus. Nada, nada, nada, nada, no caminho que percorremos que nos impeça de chegar até Deus. Devemos seguir Jesus até neste ponto extremo do “caminho estreito” que conduz a plena união com ele.
Energicamente, a alma desejosa da união divina é incitada a se elevar acima dos gostos pessoais, mesmo os mais espirituais, até o desapego total da vontade própria. “Não saber mais nada”, “Não fazer mais diferença entre sentir e não sentir, gozar e não gozar”, conservar-se decidida a superar tudo para se unir somente a Deus, esquecida de si e desprendida de tudo, chegando ao ideal de silêncio e solidão absoluta, longe de todos os seres criados.
Devemos, pois, compreender o sentido profundo que damos a esse silêncio: não se trata de “uma separação exterior das coisas exteriores, mas de uma solidão do espírito, despojamento de tudo que não é Deus”. A alma silenciosa a todos os acontecimentos de dentro e de fora, “não faz mais diferenças entre estas coisas. Transpõe-nas, ultrapassa-as, para repousar, acima de tudo, no próprio Deus”. A alma que aspira a viver na intimidade de Deus, na fortaleza inexpugnável do santo recolhimento, deve ser separada, despojada, afastada de tudo (quanto ao espírito). É o silêncio absoluto em face só de Deus.
Se alguém julga ser religioso, mas não refreia sua língua, engana-se a si mesmo: a sua religiosidade é vazia. (Tg 1, 26)
Achou-se Jesus sozinho. Os discípulos calaram-se e a ninguém disseram naqueles dias coisa alguma do que tinham visto. ( Lc 9, 36)Todas as vezes que vos encontrais juntos para orar, pedi-me uma graça em comum.
O SENHOR REINA, ALEGREMO-NOS, POIS ELE VEM!
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